Um
conjunto de livros contendo os registros dos imigrantes
que desembarcaram em São Paulo entre os séculos
XIX e XX foi reconhecido pela UNESCO por seu valor
de patrimônio documental da humanidade.
Durante os longos anos em que funcionou
como albergue para os estrangeiros que desembarcavam
em São Paulo, a Hospedaria de Imigrantes manteve
uma prática que resultou num interessante e
hoje reconhecido acervo documental. Cada viajante
que chegava tinha sua matrícula efetuada por
um funcionário da casa. Poderia então
permanecer ali por até oito dias, tempo em
geral suficiente para acertar os detalhes do contrato
de trabalho ou encontrar um emprego, usufruir das
instalações e ainda receber cuidados
médicos.
Foi assim com os três mil imigrantes que passaram
pela Hospedaria entre 1882 e 1976. O registro deles
está reunido em 191 livros, recentemente tombados
como Memória do Mundo, programa da Unesco dedicado
a identificar documentos de importância relevante
à cultura do mundo e, muitas vezes, em situação
de risco.
“Além
do nome, cada registro traz a cidade de origem
do imigrante, seus acompanhantes familiares, sua
idade e profissão, e o local de destino”,
conta Ana Maria Leitão,
museóloga e diretora executiva do Memorial
do Imigrante, responsável pela guarda e
preservação do acervo. Para ela,
as informações contidas nos livros
de matrícula representam uma fonte valiosa
para a recuperação de rotas e o
estudo dos mais variados aspectos relacionados
ao movimento desses estrangeiros. |
|
Das 76 nacionalidades assinaladas nos registros, os
italianos aparecem em peso, principalmente entre as
últimas décadas do século XIX
e 1920, quando seguiam direto para as fazendas de
café do interior paulista.
|
“Esse
período reflete a política de mão-de-obra
adotada pelo governo do estado após a abolição
da escravatura e que contou com o apoio dos cafeicultores”,
diz Ana Maria. “A viagem era subsidiada
pelo empregador por meio de agenciadores nos países
de origem”. Nos pós-guerras, o perfil
muda. Os imigrantes que chegam a São Paulo
são qualificados, vão trabalhar
na indústria brasileira, abrem seu próprio
negócio ou então chegam com emprego
já acertado. |
Construída em 1886 no bairro do Brás,
a antiga hospedaria começou a funcionar antes
mesmo da conclusão das obras, em 1888. Antes
disso, os viajantes ficavam em pequenos albergues.
“Eram três, dois deles ficavam na capital,
o outro, em Santos, uma das portas de entrada para
os imigrantes que desembarcavam no país. Os
primeiros registros foram feitos nesses locais”,
comenta Ana Maria. Em 1978, a Hospedaria recebeu o
último grupo de imigrantes. Atualmente parte
do edifício é ocupada pelo Memorial,
que divide o espaço com uma ONG italiana em
prol dos desabrigados.
|