Era
um sonho meu antigo”, diz José Ferreira
Pinto, técnico do Ministério da Agricultura,
referindo-se ao 1º Concurso Estadual de Qualidade
dos Cafés do Rio de Janeiro, a ser realizado
pelo Sindicato do Comércio Atacadista de Café
do RJ, com o apoio do CCCRJ, da ASCARJ, da Secretaria
de Agricultura do RJ, e do Armazém do Café.
O prazo final para inscrição de amostras
vai até o dia 10 de setembro de 2010 e os nomes
dos cinco ganhadores em cada categoria (são
três: naturais, descascados e despolpados) serão
anunciados no dia 5 de outubro.
Ferreira,
que atuará como um dos Coordenadores do
Concurso, conta que, desde os anos 90, observa
que a imagem negativa do café do Rio de
Janeiro parou de corresponder à realidade.
A participação do tipo Rio, de menor
qualidade, ainda é alta no estado, mas
os cafés naturais finos, e os preparados
pela via úmida – despolpados e cerejas
descascados –, de qualidade superior, representam
hoje cerca de 65% dos grãos produzidos
na região serrana, onde existe uma cafeicultura
mais empresarial, e 40% dos produzidos na região
noroeste do estado, marcada pela exploração
familiar. |
José
Ferreira Pinto e Marcos Modiano |
A região noroeste, responsável por 70%
da produção do Rio de Janeiro, produziu
ano passado 176 mil sacas, informa o técnico,
das quais 15 a 17 mil sacas são de cerejas
descascados ou despolpados.
A necessidade de beneficiar com processos úmidos
tornou-se, segundo Ferreira, um imperativo. “É
fundamental, em função de nossas características
climáticas, com muita umidade relativa do ar”.
Ferreira acredita que o Concurso de Qualidade incentiva
o produtor a aprimorar as técnicas de produção,
além de divulgar a marca do café do
Rio de Janeiro. “Tivemos reuniões com
donos de cafeterias e exportadores, que prometeram
arrematar os lotes vencedores e vender o café
com a marca do Rio de Janeiro. Ficamos muito animados”.
Ele lembra que o consumo de café no estado
representa 10% do total nacional, ou 1,5 milhão
de sacas. O concurso, diz Ferreira, está focado
em fomentar a elevação da qualidade.
Na medida em que melhorar a remuneração,
todavia, a produção também deve
aumentar. “Tudo depende da renda. O cereja descascado
do Rio é vendido hoje (16/06/2010) por volta
de 300 a 310 reais a saca. Isso é já
um ótimo negócio, mas o mesmo grão
produzido no sul de Minas é cotado a 320 reais
a saca.”
O tipo Rio, por sua vez, tem sido comercializado por
190 a 200 reais a saca, preço que não
satisfaz o cafeicultor.
Um dos fatores que mais limita o crescimento da produção
de café no Rio de Janeiro, segundo Ferreira,
é a mão-de-obra, escassa, cara e não
especializada. O custo alto da terra também
prejudica. Mesmo assim, ele vem observando um crescimento
constante da área plantada no Noroeste do estado.
“O produtor com 5 a 10 hectares de café
está obtendo uma renda razoável, tem
uma vidinha boa, está conseguindo comprar uma
terrinha a mais e aumentar o plantio”, diz Ferreira.
Entretanto, quando o produtor de café começa
a explorar áreas plantadas acima de 20 hectares,
os problemas de mão-de-obra e custo aparecem.
“O que está salvando muitos produtores
na região são as parcerias, os meeiros,
e a tendência é aumentar. Eu mesmo não
conseguiria cuidar dos meus 100 hectares se tivesse
que pagar mão-de-obra. Eu cuido de 60% por
minha conta e deixo 40% com parceiros”.
Outra saída é elevar ao máximo
a mecanização, o que é difícil
em função da topografia fortemente acidentada,
que impede o uso de tratores. Mas as famosas mãos
mecânicas, ou derriçadores, já
se tornaram populares entre os cafeicultores fluminenses.
“Ainda existe um certo medo, por parte dos produtores
do estado, em lançar mão de financiamentos
do Banco do Brasil”, diz Ferreira, “mas
o PRONAF tem funcionado bem e os recursos fluem para
o setor”.
A
importância da qualidade para o aumento do consumo
Marcos
Modiano, proprietário do Armazém do
Café, também acredita que o concurso
pode contribuir para melhorar a qualidade do café
produzido no Rio de Janeiro. “O café
é o vinho sem álcool. Temos que acostumar
as pessoas a buscarem a excelência.”
Modiano observa que as novas gerações,
que haviam se afastado do hábito de beber café,
começam a valorizar o potencial energético
da bebida. “Estão descobrindo que é
melhor tomar a cafeína natural do que a sintética
presente nesses energéticos. Há jovens
que saem da Academia e passam em nossa casa de café”,
diz o empresário, que faz questão de
distinguir o Armazém como “casa de café”,
ou seja, não se trata de uma simples cafeteria,
pois o foco absoluto é o grão, torrado
e moído na hora.
Mas a grande explosão na demanda do café
de qualidade, diz Modiano, virá quando a classe
C, que vem experimentando um importante aumento de
seu poder aquisitivo, decidir beber cafés melhores.
Modiano admite que não usa café do Rio
de Janeiro em suas casas, mas está disposto
a fazê-lo na medida em que se torne mais fácil
adquirir os grãos de qualidade superior produzidos
no estado. “Eu uso de 33 a 42 sacas por mês.
E faço estoque. Aliás essa é
uma dificuldade vivida pelas cafeterias cariocas.
São forçadas a adquirir cafés
de outros estados e a formar estoques.”
O ideal para as cafeterias, que lidam com pequenas
quantidades, seria comprar os grãos no próprio
estado, o que lhes permitiria conviver com estoques
menores, já que poderiam ser recompostos em
poucas horas. “A logística melhoraria
muito”.
O Armazém do Café, pioneiro no varejo
de cafés especiais no Rio de Janeiro, conta
hoje com 7 lojas. Segundo Modiano, aproximadamente
30% do faturamento vem da venda de “acessórios”
para o consumo de café, como máquinas
de espresso e charutos cubanos. “São
produtos de alto valor agregado”.
Guilherme
Braga, Presidente do Sindicato do
Comércio Atacadista de Café do Rio
de Janeiro vê a importância do Concurso
como uma forma de despertar a consciência
do produtor para a necessidade de fazer um café
de melhor qualidade, acompanhando a tendência
que se observa em outras regiões produtoras
do país. “O Rio pode até aumentar
um pouco sua produção, mas nosso
foco é incrementar a qualidade, e tornar
mais visível o Rio como produtor de café
de alta qualidade”. |
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Segundo Braga, das 300 mil sacas produzidas no Rio,
bastariam que metade fosse de um tipo melhor, para
que uma das metas do Concurso estivesse cumprida.
“Além disso, o Concurso quer ajudar o
café do Rio a encontrar uma identidade”.
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Para
Efigênio Salles,
Presidente da Associação dos Cafeicultores
do Estado do Rio de Janeiro (ASCARJ), o Concurso
de Qualidade visa promover os cafés produzidos
no estado, mas não há interesse
de que o Rio se torne um grande produtor. “O
Rio já foi o maior produtor de café
do mundo, depois perdeu importância em quantidade.
Para piorar, ganhou fama de baixa qualidade. Mas
nosso foco é, mantendo a quantidade produzida,
aumentar o percentual de cafés cerejas
descascados, ou despolpados, e vender esse café
para os nichos de mercado da capital. |
Para
um dos Diretores da exportadora Valorização,
Manoel Correa do Lago,
a ideia do Concurso é muito bem vinda.
“É um encorajamento à cafeicultura
do estado do Rio”. Para ele, seria ótimo
que o estado produzisse mais café e observa
que há áreas no Rio que colhem café
de altíssima qualidade. “Nós
compramos café do Rio, e gostaríamos
de comprar mais. Mas o estado precisa dar logo
solução – e sei que há
um processo em curso nesse sentido – à
falta de um maquinário de rebeneficiamento”.
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Resolvendo
esse gargalo, haveria melhora nas condições
de comercialização e aumento da produção.
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Jair
Coser, Presidente da Unicafé,
uma das maiores exportadoras de café do
Brasil e do mundo, considera que o Concurso é
muito importante, e não apenas para o Rio.
“É importante para toda a nossa cafeicultura,
do Brasil inteiro, porque o mundo quer mais café
brasileiro de qualidade. Colômbia e América
Central estão com produção
insuficiente de cafés lavados e os importadores
estão procurando cada vez mais os cafés
brasileiros, que ainda são mais baratos.
A Starbucks, por exemplo, está comprando
muito no Brasil”. |
O exportador lembra que é também cafeicultor,
e que na região onde produz, no Espírito
Santo, as diferenças entre cafés convencionais
e o descascado ampliaram-se. “Um café
natural, de qualidade normal, é vendido por
R$ 260 a R$ 280, enquanto paga-se R$ 320 a saca por
um descascado.
Coser observa que a topografia não é
justificativa para o Rio não elevar a sua produção,
visto que o Espírito Santo apresenta características
geográficas similares e deve produzir 11 milhões
de sacas este ano, 2,5 milhões de arábica
e 8,5 milhões de conillon. “Ao contrário,
há uma forte demanda pelo café de montanha,
considerado de melhor qualidade”, diz o exportador.
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