No
plano institucional, o café sofreu nos últimos
dias um sério revés. Após um
longo período, coincidente com o início
do Governo Lula, na gestão do Ministro Roberto
Rodrigues e do Secretário Linneu da Costa Lima,
durante o qual todos os assuntos de interesse do negócio
café foram sempre, sem qualquer exceção,
submetidos à previa análise do CDPC
Conselho Deliberativo da Política do Café,
que reúne todos os segmentos da cadeia, ao
lado de representantes dos vários órgãos
governamentais ligados ao café, a decisão
recente do MAPA, ao estabelecer as regras do PEPRO
Prêmio Equalizador Pago ao Produtor sem ouvir
o Colegiado, interrompeu esse ciclo virtuoso.
Dispensa comentar o retrocesso a que está se
levando o processo decisório nos assuntos da
política cafeeira e o efeito que isso pode
ter no futuro. É consenso geral que o espírito
de cadeia imprimido nos últimos tempos fortaleceu
o setor cafeeiro, amadureceu o relacionamento entre
todos os segmentos, trouxe avanços institucionais
extraordinários, e proporcionou um compartilhamento
responsável entre os setores público
e privado. Embora se soubesse que a nova ordem não
era unanimidade, pois alguns pareciam ainda preferir
o caminho dos gabinetes, havia, talvez por excesso
de otimismo, a sensação de que o processo
estava consolidado. Ledo engano.
De outro lado, a manifestação do CECAFÉ,
acompanhada pela ABIC e ABICS, de inconformismo quanto
a não audiência do CDPC, bem como as
críticas feitas quanto à falta de transparência
na questão da aplicação de recursos
públicos e de cerceamento à participação
de produtores autônomos em visível favorecimento
às cooperativas, ao invés de gerar um
debate sobre esses temas, foram questionadas como
se a intenção fosse a de atacar a aplicação
do PEPRO, o que definitivamente não é
correto.
O PEPRO, como se sabe, é um mecanismo criado
pela Lei no. 9.848, de 26/10/1999, a qual autorizou
o Poder Executivo a conceder aos produtores rurais
subvenções econômicas (subsídios),
sob forma de equalização de preços
ou de equalização de taxas de juros
e encargos de operações de crédito
rural. Esse subsídio vem sendo concedido nos
últimos anos, em substituição
ao sistema de Opções Públicas,
com recursos previstos no orçamento da política
agrícola a diversos produtos, como a soja,
milho, feijão, algodão, etc., nos casos
em que os preços de mercado estejam abaixo
do custo de produção. Quando a subvenção
é concedida aos produtores sob a forma de equalização
de preços, a habilitação dos
produtores se faz através de Leilões
de Arrematação promovidos pela CONAB,
no qual apura-se o valor do subsídio, que será
recebido pelo produtor após comprovar a colocação
do produto no mercado, atendidas as condições
estabelecidas. Na soja, por exemplo, o subsídio
dado pelo Governo via PEPRO, no ano passado, aproxima-se
de R$ 1 bilhão.
O Ministro Luiz Carlos Guedes, no final de sua gestão,
trouxe o PEPRO ao café, apartando R$ 200 milhões
do orçamento da política agrícola
para o produto. A iniciativa foi aplaudida, com o
apoio unânime de todos os segmentos, uma vez
que possibilita, através do subsídio
governamental dado ao produtor, o recebimento de uma
remuneração mínima que, inclusive,
como acentuado pelo CECAFÉ, é uma forma
de amenizar as perdas de renda resultantes da valorização
cambial. A partir desse cenário, e já
na atual gestão do MAPA, o CDPC deliberou remeter
a matéria para o seu Comitê de Planejamento,
para a definição das regras. O Comitê
foi convocado duas vezes para apreciar o tema e, em
ambas, o setor de produção pediu a retirada
da pauta. Como se sabe, daí então, a
matéria passou a ser conduzida exclusivamente
entre órgãos do MAPA e o segmento da
produção, resultando o Aviso de Leilão
publicado pela CONAB, ora em contestação
pelos inúmeros vícios e contradições
que apresenta.
Pelo que se depreende das declarações
dadas à imprensa pelo presidente do CNC e do
representante da CNA, o MAPA não teria submetido
a questão à deliberação
do CDPC pelo entendimento de que, como não
envolve o uso de recursos do FUNCAFÉ, por esta
razão, não se insere na esfera de atribuições
do Conselho que delibera sobre a política do
café. A interpretação agride
o bom senso, não resiste a uma leitura superficial
da legislação institucional do CDPC
e conflita com os princípios que nortearam
a sua criação, e com a tradição
de que todos os assuntos sejam decididos pelo Colegiado,
tal como os Leilões de Opções
Públicas, que também tem os seus recursos
originários do orçamento da política
agrícola.
Ainda que não fosse assim, a decisão
do MAPA de subtrair do exame e da definição
das regras operacionais do PEPRO pelo CDPC se torna
mais injustificável e preocupante na medida
em que o Secretário Executivo do Ministério
já anunciou a sua intenção de
incluir no orçamento do ano seguinte um volume
de 10 milhões de sacas no mecanismo do PEPRO.
Neste cenário, caberá ao CDPC algum
papel relevante na política do café?
Guilherme
Braga Abreu Pires Filho
Presidente do CCCRJ e Diretor Geral do CECAFÉ |