Home
Porto do Rio Consolida Retomada das Exportações de Café
Multiterminais Amplia Estrutura Operacional
Setembro 2008 - Ano 87 - Nº 827

AVANÇAR
04
VOLTAR
 

A situação continua complicada para a cafeicultura fluminense. Vão longe, muito longe, os faustosos tempos dos barões, quando a região ostentava o título de maior produtora mundial e patrocinou, com a exportação do produto, a recém declarada independência política do país. Com o fim da escravidão, as grandes fazendas do sul do estado foram à falência, e hoje o Rio responde por menos de 1% da produção nacional.

O principal problema do setor, hoje, é não possuir módulos de rebeneficiamento, obrigando os produtores a enviar seus cafés para armazéns de Minas e Espírito Santo, onde o produto é padronizado e mandado de volta. O passeio custa caro e provoca complicações fiscais, por causa da passagem de um estado a outro. Uma boa quantidade, portanto, é deslocada sem nota e desaparece do mapa. Com menos café visível, as fontes de financiamento também caem, e assim o setor permanece preso a um ciclo vicioso que não parece ter fim.

Para quem não sabe, o rebenefício é a separação do café por peneiras (tamanho de grão), cores (verde ou maduro) e defeitos. É um processo obrigatório para preparar o produto para o mercado. Apenas depois desta padronização, é possível separar lotes com preços diferenciados, destinados aos diversos públicos compradores, externos e domésticos.

Central de Rebenefícios

Consultados pela Revista do Café, todos os entrevistados foram unânimes num ponto: o Rio precisa, muito, de um ou mais módulos de rebeneficiamento. Silvio Bennetti, corretor que opera no estado há mais de 20 anos, é autor de um projeto para instalar um desses módulos na Coopercanol, na região do Noroeste fluminense, onde se concentram cerca de dois terços da área cafeeira do estado. O custo é estimado em R$ 1 milhão. O governo do estado demonstra interesse em ajudar, mas exige contra-partidas financeiras das prefeituras da região, sobretudo de Varre-Sai, principal município produtor do Rio de Janeiro, explica Bennetti. O corretor argumenta que, devido ao baixo volume produzido no estado, dificilmente a iniciativa privada interessar-se-á em construir um módulo, e por isso o Estado deveria dar o pontapé inicial, que acarretaria, segundo ele, num excelente estímulo para elevar a produção de café no Rio de Janeiro. O ideal, concorda Silvio, é que fossem construídos dois módulos, um no Noroeste e outro na região serrana, os dois principais pólos produtores do estado; mas um no Noroeste, pra começar, já seria de bom tamanho. “O político que fizer esse módulo entrará para a história como um herói”, observa Silvio.

Em entrevista exclusiva para a Revista, o secretário de Agricultura do Rio de Janeiro, Christino Áureo, admitiu a grande necessidade de um módulo de rebenefício no estado. Explicou que tentou incluir o projeto citado por Bennetti (usando as instalações da Coopercanol) no orçamento deste ano, mas não foi possível. Tentará incluí-lo no orçamento de 2009. Áureo confirmou que o valor da obra deverá ficar em torno de R$ 1 milhão e que deverá, inicialmente, ter capacidade de processar 100 mil sacas por ano. Num segundo momento, essa capacidade poderia ser ampliada para 200 mil sacas. O problema continua sendo a busca de parcerias com prefeituras para dividir as despesas.

Christiano Áureo, Secretário de Agricultura do RJ

Na verdade, apenas um produtor no estado possui armazém com maquinário completo de rebenefício: Aloysio Erthal, produtor em Bom Jardim, região serrana. A propriedade é hoje gerenciada por seu filho, Miguel Erthal, que, em entrevista para a Revista, informou que a fazenda está produzindo atualmente cerca de 20 mil sacas por ano – das quais 70% são vendidas para exportadores, e 30% usadas integralmente na torrefadora da fazenda, a Bom Jardinense. Os números posicionam Erthal como maior produtor do estado do Rio.

Erthal filho conta que a família produz café nas atuais fazendas desde 1973, mas apenas a partir de 2000 decidiu abandonar as atividades com frango para se focar no café. “Nossa área plantada hoje é de 550 hectares e obtemos uma produtividade média de 40 sacas por hectare”. Quanto ao custo, Erthal diz que eles explodiram este ano, por conta do salto no preço dos fertilizantes. “No ano passado, antes da alta do adubo, nossos custos estavam em R$ 180 a saca. Este ano, os custos devem ultrapassar R$ 250 a saca”.

As fazendas de café da família Erthal possuem 100 empregados fixos e contratam mais 250 na época da colheita – que, na data da entrevista (15/09/2008) apresentava atraso de 3 semanas, faltando 30% para ser finalizada. Os trabalhadores são contratados nas adjacências. O pagamento, como de praxe, é feito por balaio de 60 litros, R$ 9 cada. É um preço alto. Outro produtor, Moacir Carvalho, que possui 20 hectares de café em Duas Barras e 4 empregados fixos, informa que, este ano, pagou R$ 6 no início da colheita, R$ 7 no meio e, no fim, R$ 8 por balaio de 60 litros.

Nova Tecnologia para a Colheita

Ambos concordam que a mão-de-obra é a maior preocupação dos cafeicultores fluminenses. A topografia acidentada impede a mecanização, mas Erthal afirma que está aumentando o uso do derriçador, equipamento acoplado às costas do trabalhador, dotado de uma espécie de mão mecânica, que permite uma colheita mais acelerada. Estima-se que um homem com derriçador substitui três trabalhadores que não usam a máquina. Por conta disso, muitos produtores do estado, inclusive os de regime familiar do Noroeste, estão usando bastante essa nova tecnologia. Muitos trabalhadores são donos dessas máquinas e vendem sua mão-de-obra com preço diferenciado, a R$ 90 ou R$ 100 por dia.


José Ferreira Pinto, superintendente da Regional
fluminense do Ministério da Agricultura
José Ferreira Pinto, superintendente da regional fluminense do Ministério da Agricultura, conta que o derriçador mecânico tem feito grande sucesso no Noroeste, e que seu preço é bem acessível, cerca de R$ 2,6 a R$ 3,3 mil. Também cafeicultor, com cerca de 110 hectares plantados e produção de 3,8 a 5 mil sacas, Ferreira estima o custo de produção no Rio em R$ 170 a R$ 250, a depender da produtividade e tecnologias empregadas.

Todos os entrevistados se mostraram céticos quanto à possibilidade do Rio elevar sua produção de café. Erthal revelou que vários produtores da região serrana vêm, paulatinamente, abandonando a atividade. A alta no custo dos fertilizantes e da mão-de-obra estão desestimulando os produtores. E o bom nível de industrialização do estado, agora um grande produtor de petróleo, tem levado as novas gerações a se afastarem do setor agrícola, procurando empregos na indústria e no setor de serviços, que oferecem maior estabilidade e menos riscos. “Não tem gente nova entrando e as propriedades estão diminuindo de tamanho”, adverte Ferreira.

Rio de Janeiro: Mercado de Qualidade

O próprio secretário de Agricultura, em função da área pequena e topografia acidentada, acredita que o potencial agrícola do estado só poderá ser plenamente alcançado através da exploração dos nichos de qualidade. “O Rio de Janeiro tem o segundo maior mercado consumidor do país e o primeiro em termos de produtos de qualidade, e o poder aquisitivo também é alto – estudos nossos apontam que a renda per capita fluminense superou a de Brasília, considerada a número um”, analisa o secretário.

Na opinião de Ferreira, a estagnação da produção de café no estado não é falta de apoio oficial. “Tivemos um problema este ano com o Banco do Brasil, que ainda não liberou a verba do Funcafé para o Rio, mas o Pronaf fluiu bem. No ano passado, os recursos vieram no tempo certo. O problema no Rio é a perda da vocação agrícola do povo fluminense, a topografia difícil, a escassez de mão-de-obra, que sofre concorrência das grandes cidades, sobretudo o Rio. E agora, com o florescimento da indústria do petróleo no estado, muita gente está tentando trabalho no setor e abandonando as áreas rurais”, comenta Ferreira.

Segundo Silvio Bennetti, os principais compradores no Rio são as exportadoras Unicafé e Tristão. Entre as torrefadoras, as que mais adquirem o produto no estado são as donas das marcas Favorito, Capital, Câmara e, às vezes, o Bom Dia. Bennetti diz que as torrefadoras do Rio continuam enfrentando grave crise. As torrefadoras instaladas no Rio são obrigadas a comprar café beneficiado em Minas ou ES, o que traz complicações fiscais extremamente onerosas à atividade.

O problema da falta de um módulo de rebenefício causa ainda um outro problema: a proliferação de uma classe de atravessadores, que compram café de produtores, enchem um caminhão velho, e vão até outro estado, levando mercadoria sem nota, diz Bennetti. “É uma economia porca, porque são pessoas descapitalizadas – oito em cada dez atravessadores quebram e não pagam os produtores”, denuncia o corretor.

Organização de Produtores

Tentando resolver esses e outros problemas, com o apoio do CCCRJ Centro do Comércio de Café do Rio de Janeiro, um grupo de produtores criou, em 2001, a Associação de Cafeicultores do Estado do Rio de Janeiro, a Ascarj, cujo presidente foi, até pouco tempo, Efigênio Salles, entrevistado pela reportagem.

Salles informa que, atualmente, o Rio tem cerca de 1.600 produtores, dos quais 1.300 são cadastrados na entidade. Também cafeicultor, Salles deve produzir cerca de 2.500 sacas este ano, obtendo uma produtividade de 45 a 50 sacas por hectare. Segundo ele, a maioria dos produtores fluminenses, inclusive ele, usa a variedade genética Catuaí, e cerca de 40% da produção de café na região serrana é processada na forma de cereja descascado. Salles também acredita que o caminho da cafeicultura fluminense não é elevar a produção, e sim ampliar sua participação no mercado de cafés especiais.

Efigênio Salles, cafeicultor

A Federação de Agricultura do Estado do Rio de Janeiro (Faerj), em parceria com o Sebrae, publicou em 1998 um Diagnóstico da Cafeicultura do Estado do Rio de Janeiro. O estudo, apesar de antigo, ainda é válido, porque as estruturas fundiárias não sofreram mudanças significativas.

Segundo esse Diagnóstico, o Rio tinha em 1998 um total de 1.268 produtores, dos quais 398 com menos de 10 hectares; 554 com 10 a 50 ha; 156 com 50 a 100 hectares; 137 produtores com 100 a 500 hectares de café; e 18 produtores com mais de 500 hectares. As regiões Noroeste e Serrana tinham mais de 95% dos cafeicultores fluminenes, mas o Sul, com apenas 25 produtores, tinha 1.567,78 hectares de café (média de 74,6 ha por produtor). O Noroeste tinha 7.311 hectares plantados (8,34 ha por produtor, em média) e a região Serrana, 1.904 hectares (13,32 ha por produtor). Os principais municípios produtores são Varre-Sai, com 399 produtores; Porciúncula, com 393; ambos no Noroeste. Na região Serrana, destaca-se Bom Jardim, com 113 produtores, e Duas Barras, com 28.

Esses dados, é importante reiterar, correspondem ao ano de 1998. Dados mais atualizados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), referentes ao ano de 2006, mostram a virtual extinção da cafeicultura no sul fluminense, e um crescimento modesto no Noroeste e no Centro (região serrana). O IBGE estima a área cafeeira fluminense em 2006 em 13.770 hectares, com queda ligeira sobre o ano anterior.

Quanto à produção, o estado do Rio produziu 264.600 sacas em 2006, com o Noroeste respondendo por 71% do total; o Centro por 21% e a região metropolitanta do Rio, por 5,7%. Os municípios de Varre-Sai, Porciúncula, Bom Jardim, Bom Jesus do Itabapoana, Duas Barras e São José do Vale do Rio Preto, responderam por 93% da produção fluminense de 2006.

Para 2008/09, o IBGE estima que o Rio de Janeiro deverá produzir 264 mil sacas de 60 kg, o que representaria queda de 6% sobre o ano anterior.

Com a época dos barões enterrada num passado longínquo, e sem perspectivas muito otimistas, as esperanças da cafeicultura fluminense concentram-se na iniciativa do governo estadual em construir, finalmente, um módulo de rebeneficiamento, que a libertaria da dependência de armazéns de outros estados e abriria a possibilidade de elevar sua população cafeeira.

REVISTA DO CAFÉ - INÍCIO
 
Rua da Quitanda, 191 - 8º andar - Centro - Rio de Janeiro - Brasil - Tel: (21) 2516-3399 / Fax: (21) 2253-4873 - email: riocafe@cccrj.com.br
Todos os direitos reservados - copyright 2006 - Centro de Comércio do Café do Rio de Janeiro - Desenvolvido por Ivan F. Cesar