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Setembro 2008 - Ano 87 - Nº 827

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A Constituição Federal prevê que as cooperativas brasileiras devem receber tratamento tributário específico, em virtude de sua natureza sócio-econômica. Essa prerrogativa legal muitas vezes é confundida com o oferecimento de benefícios indiscriminados a esse setor em detrimento das demais formas de organização empresarial.

As autoridades tributárias, no entanto, entendem e praticam como “adequado tratamento tributário” nada mais é que o simples reconhecimento do Ato Cooperativo como operação não comercial, ou seja, realizada sem fins lucrativos e que, portanto, não gera base de cálculo para incidência de alguns tributos.

Aliás, é exatamente isso que a Lei 5764/71, em seu artigo 79, define:

“Denominam-se atos cooperativos os praticados entre as cooperativas e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entre si quando associadas, para consecução dos objetivos sociais.”

“Parágrafo único. O ato cooperativo não implica operação de mercado, nem contrato de compra e venda de produto ou mercadoria.”

O Ato Cooperativo, nesse contexto, é entendido como a operação que envolve cooperativa e associado(s) em seus extremos e que é praticado de acordo com o objetivo social do empreendimento.

Como exemplo, a entrega da produção por parte do cooperado à sua cooperativa agropecuária é definida como tal, uma vez que envolve a entidade e seu quadro social e não foge ao padrão de atividades do negócio.

A etapa posterior a esse recebimento, que envolve beneficiamento e/ou comercialização dos produtos entregues, não pode ser caracterizada como ato não cooperativo à medida que diz respeito à operação realizada pela cooperativa em nome de seus proprietários. Nesse caso, a organização jurídica nada mais é do que intermediária entre aqueles que a constituem e o mercado.

Ato não-cooperativo propriamente dito pode ser exemplificado pela compra de produtos agrícolas de não-associados por parte de cooperativas agropecuárias, pela venda de mercadorias a não-associados em cooperativas de consumo, entre tantos outros casos que envolvem operações rotineiras das cooperativas, mas que são esporadicamente realizadas com não integrantes do quadro social.

Da mesma forma, a venda de um veículo usado por uma cooperativa de crédito a um de seus cooperados também pode ser classificada como ato não-cooperativo, uma vez que envolve, a despeito de ser realizada entre cooperativa e associado, operação comercial não afeita ao objetivo social daquela.

O resultado positivo apurado com as operações classificadas como atos não-cooperativos, denominado Lucro, deve ser invariavelmente transferido à conta da Reserva de Assistência Técnica, Educacional e Social (RATES) e só poderá ser utilizado para financiamento das despesas oriundas de tais atividades.

Já o resultado negativo de atos não-cooperativos é chamado de Prejuízo e deverá ser compensado pelo saldo da conta de Reserva Legal. Caso esse seja insuficiente, o mesmo deve ser rateado entre todos os que integravam o quadro social da cooperativa no ano em que foi gerado.

Já o resultado positivo oriundo de atos cooperativos é definido como Sobras, ou seja, o excesso de ingressos em relação aos dispêndios da organização. Como tal, portanto, deve ter seu destino decidido pelos seus donos, os cooperados, em Assembléia Geral. Essas sobras, como o próprio nome indica, não geram tributos como Imposto de Renda ou Contribuição Social pela sua própria natureza, isto é, por não serem Lucro.

Já o resultado negativo de atos cooperativos, denominado Perdas, tem o mesmo destino observado para o Prejuízo porventura apurado, ou seja, deve ser compensado com o saldo da conta de Reserva Legal e, se esse for insuficiente, rateado entre os associados.

Todas essas questões podem ser consideradas como consenso entre o setor cooperativista e as autoridades tributárias no Brasil. Em outras palavras, a tributação dos resultados apurados pela cooperativa é líquida e certa no que diz respeito a atos não-cooperativos. Já em relação aos atos cooperativos, não há geração de base de cálculo para incidência de impostos.

A polêmica está na aplicação dos tributos incidentes sobre o faturamento desse tipo de organização. Afinal, como comentado, uma cooperativa agropecuária não vende produtos de sua propriedade, mas representa seus associados no mercado e transfere aos compradores bens, beneficiados ou não, pertencentes a aqueles.

Nesse sentido, o ingresso de recursos pela realização dessa operação de venda deixa dúvidas quanto à sua classificação como receita (faturamento) da própria instituição. Pode-se dizer que esse ingresso nada mais representa para a cooperativa do que uma simples dívida a ser repassada a seu quadro social, devendo ser classificada, portanto, como passivo, e não em conta de resultado.

De acordo com essa interpretação, a receita propriamente dita do empreendimento seria constituída, apenas, dos valores retidos no momento do repasse dos ingressos de vendas aos cooperados. Assim, a base de cálculo para incidência de tributos como PIS e COFINS, por exemplo, seria significativamente reduzida.

Embora não haja consenso sobre esse tema, talvez a definição formal de sua legalidade realmente faça jus ao que a Constituição Federal chama de “adequado tratamento tributário” ao setor cooperativista.

A mera não incidência de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre as Sobras de uma cooperativa nada mais é do que a aplicação inequívoca da lei, sem nenhum tipo de tratamento diferenciado a essa organização que impulsiona o desenvolvimento social e econômico de seus integrantes e de sua região.

Não se pode dizer que apenas esse reconhecimento do que deveria ser indiscutível configura-se como o que é prerrogativa constitucional do setor cooperativista. As cooperativas, como Sociedade de Pessoas, disputam mercado com organizações empresariais que concentram no Capital seu poder de decisão e, consequentemente, possuem estrutura administrativa mais ágil e menor comprometimento com as questões sociais que envolvem suas atividades.

Nesse contexto, o reconhecimento do simples papel de intermediação que as cooperativas realizam entre produtores e mercado pelo governo poderia ser caracterizado, sim, como “adequado tratamento tributário” ao setor.

Esse tipo de medida, ao contrário do que muitos afirmam, não significa favorecimento indiscriminado a um setor, mas a simples consolidação de um sistema de incentivo àqueles que exercem suas atividades de acordo com rígidos princípios de responsabilidade social, definidos e praticados muito antes do atual momento de preocupação com esse tipo de atitude.

Brício dos Santos Reis
Professor Adjunto (Curso de Graduação em Gestão de Cooperativas e Programa de Pós-graduação em Economia Aplicada) do Departamento de Economia Rural da Universidade Federal de Viçosa.

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