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Setembro 2008 - Ano 87 - Nº 827

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Diz a máxima que “quando se está vendo a luz no fim do túnel, é melhor certificar-se de que não é um trem na direção contrária”. Pois é, a despeito de todo o esforço – diversos estímulos de liquidez, monetários e fiscais -, a crise financeira internacional avança desde julho do ano passado. Esta semana, um dos maiores bancos americanos, Lehman Brothers, declarou falência e outro, Merrill Lynch, teve que ser vendido. Na semana passada, Fannie Mae e Freddie Mac, duas grandes agências de financiamento hipotecário, foram resgatadas pelo governo americano. Este ano já tivemos o resgate do Bear Stearns. Alguns comparam a crise atual com a de 1930. Pode ser ainda exagero. Mas o período é certamente excepcional no sistema financeiro internacional. Quais são as lições da crise?

Ainda está cedo para reflexões completas sobre as lições da crise. Os custos da crise não devem ser cobrados das decisões contemporâneas (por exemplo, salvar ou deixar quebrar), mas das do passado. Faltou serenidade e limites em várias dimensões nos últimos anos. Os investidores minimizaram o risco das suas aplicações; as agências de classificação corroboraram a idéia de que havia pouco a se preocupar; os bancos estimularam os excessos vendendo ativos ruins em novas embalagens e veículos; os reguladores deixaram esses novos veículos não fazerem parte do balanço dos bancos (e, portanto, requereram menos capital do que o desejado); e os bancos centrais estimularam os excessos com juros baixos por tempo prolongado.

No caso dos EUA (e na Europa também), as lições desta crise servirão para evitar uma próxima, pelo menos nos moldes da atual. Os reguladores deveriam atuar de forma contracíclica, exigindo mais prudência (leia-se capital, provisionamento, etc.) nos momentos de bonança. E nem pensar em deixar veículos de investimento fora dos balanços e da exigência de capital. As agências de classificação poderiam ter menos relevância para a decisão de crédito e avaliação de risco por parte dos bancos. Os bancos centrais também atuariam na contramão dos excessos, elevando os juros quando surgirem o que parecem ser bolhas, ou seja, excessos nos mercados de ativos. Os bancos, por sua vez, deveriam reforçar suas áreas de risco, de alguma forma tornando-as menos suscetíveis a pressões das áreas de investimentos e negócios e os seus modelos menos permeáveis a percepções otimistas quanto aos preços futuros (no auge da euforia, os modelos assumiam riscos de quedas menores).

Enfim, todos os envolvidos têm que colocar limites de velocidade automáticos para funcionarem no próximo ciclo de prosperidade e otimismo. No Brasil, o momento deveria ser de reflexão. Até quando vai a crise? Qual é o melhor curso de ação?

Alguns analistas estão se debruçando nessas questões. Mas outros, inclusive alguns ministros e ex-ministros estimulados pelo clima na comemoração dos 200 anos do Ministério da Fazenda, rapidamente preferiram entrar em embates ideológicos ultrapassados. Os resgates nos EUA supostamente demonstraram que o “neoliberalismo” (inimigo de fantoche favorito) e até o capitalismo estariam “enterrados”. Afinal, os resgates promovidos pelo governo americano teriam mostrado a necessidade da intervenção do Estado. Fica a dúvida se já esta semana o “neoliberalismo” voltou a renascer, ao deixarem a Lehman Brothers falir. De qualquer forma, a crítica ideológica dirige-se a um “fantoche”: a idéia que o mercado (e em última instância o capitalismo) prescinde de regras, regulação e instituições fortes.

Em minha opinião, os erros que esta crise revela são anteriores às decisões de resgatar ou deixar falir instituições financeiras. Não há alternativa boa hoje. Foram os exageros cometidos no período de prosperidade – quando do boom da bolsa, do mercado imobiliário e outros ativos - que estão repercutindo hoje.

Seria triste que as lições tupiniquins sobre a crise se resumissem à visão equivocada sobre a necessidade de maior intervenção do Estado brasileiro na economia - leiam-se maiores gastos, contratações, etc. -, para além daquela que os 40% do PIB em arrecadação tributária já hoje permitem.

A lição verdadeira é despender esforços para identificar e atuar sobre os excessos que ocorrem nos momentos de bonança. Nesse sentido, podemos dizer que se há excessos na economia brasileira, eles deveriam ser, hoje, combatidos de forma a manter a economia crescendo de maneira sustentada e evitar problemas futuros.

Em uma dimensão, essa lição já vem sendo adotada. O Banco Central do Brasil (BC) já faz vários meses identificou no contexto atual um crescimento da demanda (consumo, gastos do governo, investimento) que vai além da capacidade de suprimento da economia, o que coloca riscos inflacionários no sistema. Para combater esse excesso na economia, o BC tem subido os juros de forma a promover uma desaceleração na economia (ainda não aparente). Em outras dimensões, os excessos ainda correm soltos. Os gastos do governo crescem a taxas que não são sustentáveis e que não serão facilmente reversíveis em momentos de dificuldade, em especial, as contratações e aumentos salariais concedidos ao funcionalismo. Outros exemplos existem. O crédito no Brasil cresceu 30% nos últimos 12 meses.

Em suma, a crise financeira internacional ainda não encontrou seu fim. As lições da crise mostram que é imperioso atuar nos momentos de bonança. Ideologias à parte, é imperioso questionar se estamos fazendo o suficiente para combater os excessos atuais. No Brasil, como foi no exterior, os custos dos excessos só poderão ser medidos e julgados quando o ciclo mudar, certamente não quando a economia cresce 6% e a popularidade está em alta.

Ilan Goldfajn
Sócio da Ciano Investimentos, diretor do IEPE da Casa das Garças e professor da PUC-Rio, igoldfajn@cianoinvest.com.br

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