Em
âmbito da produção agropecuária,
depois das previsões de safra, o tema que provavelmente
mais controvérsias gera são os custos
de produção, especialmente da lavoura
cafeeira, pois, como sabido é, pratica-se nessa
cultura uma miríade de modalidades de sistemas
de produção que nos impede, inclusive,
de identificar a existência de modelos tecnológicos
como comumente encontrados nas lavouras de grãos
e fibras(1).
Há que se ter clareza quanto à forma
como são obtidas as estimativas de custos de
produção. Primeiramente, são
estabelecidos tipos ideais de cafeicultores, para
os quais são projetados os coeficientes técnicos
empregados na condução de um hectare
de lavoura em termos de horas máquina, dias-homem,
toneladas de fertilizante, litros de defensivos, etc..
Nessa altura, o primeiro critério subjetivo
é introduzido e diz respeito à construção
do tipo ideal para aquela região produtora
em particular, pois se define a priori tanto a tecnologia
agronômica empregada como ainda estabelece-se
a média de produtividade alcançada.
Por definição, as estimativas de custo
de produção devem representar os valores
(quantidade consumida e preço) de todos os
serviços produtivos e fatores empregados na
oferta de uma utilidade econômica, sendo esse
valor global equivalente ao sacrifício monetário
total empenhado pela firma que a produz. Dessa feita,
conclui-se, que tanto os valores contabilizados como
os fatores aplicados para produzir um bem necessitam
ser remunerados.
A baixa rentabilidade da produção primária
impõe, por si mesma, a necessidade do monitoramento
dos custos de produção. Ademais, elaboração
de estimativas de custo de produção
é informação estratégica,
pois permite ao tomador de decisão da empresa
(agrícolas ou não, formais ou não),
estabelecer critérios mais eficazes no esforço
de alcançar remuneração positiva
para seu esforço monetário explícito
(fluxo de caixa operacional), ou implícito,
decorrentes das depreciações e encargos
sobre os custos efetivamente desembolsados. Somente
dispondo de uma estimativa de custo de produção
é que se pode induzir o incremento tanto econômico
como agronômico da eficiência da exploração.
Na ausência de tal ferramenta de administração,
qualquer tentativa de gestão sobre o processo
produtivo não passará de mero voluntarismo
de duvidosos resultados.
É por meio dos custos incorridos que se tem
condições para efetuar um planejamento
da comercialização antes mesmo de se
iniciar o ano safra. A ferramenta concede maior sensibilidade
diante de alternativas alocativas, ou seja, permite
realizar a opção mais conveniente diante
da sinalização do mercado futuro de
preços para determinada commodity.
Também, para os gestores das políticas
públicas voltadas para a agricultura, a construção
de matrizes de custo de produção permite
que sejam melhores balizados os parâmetros que
subsidiaram a formulação de suas ações
como: o estabelecimento dos preços mínimos
para a safra corrente (AGF/EGF); a adoção
de mecanismos de compensação em situações
em que os preços de mercado não remuneram
adequadamente os valores e fatores empregados (PEPRO);
facilitação da orientação
a ser repassada aos produtores por parte do serviço
de extensão rural e, ainda, cria demandas para
a pesquisa tecnológica que agregue inovações
mais eficazes na utilização dos fatores
produtivos.
Tendo em conta tais considerações, torna-se
menos controverso o esforço de análise
das estimativas de custo de produção
de café arábica elaboradas pela Companhia
Nacional de Abastecimento (CONAB) para a safra 2007/08,
sendo que a maior parte desse café colhido
no ano passado já foi comercializada(2).
Os técnicos responsáveis pelo levantamento
acertam ao regionalizar as informações,
pois reconhecem que há diferenciações
tecnológicas e sócio-econômicas
relevantes entre os cinturões produtores considerados:
Franca/SP, Guaxupé/MG; Luis Eduardo/BA; Londrina/PR;
Manhuaçu/MG; Patrocínio/MG e São
Sebastião do Paraíso/MG. Os resultados
para as estimativas de custos de produção
da última safra, em escala crescente, podem
ser sumariados (Tabela 1).
O custo variável resulta da agregação
de três sub-contas: as despesas de custeio da
lavoura; as despesas com o pós-colheita e as
financeiras, essas últimas, basicamente, constituídas
pelos juros pagos nos empréstimos contratados.
Devido à maior produtividade média considerada
em Luis Eduardo (cafeicultura irrigada com média
de 55sc/ha), nessa região foi observado o menor
custo de produção unitário (R$155,04/sc),
referendando a hipótese de que o investimento
em tecnologia de manejo, ainda que incremente o custo
por unidade de área, reduz fortemente os custos
por unidade de produto. Em contrapartida, o maior
custo variável foi encontrado em São
Sebastião do Paraíso, alcançando
R$199,55/sc. Nessa região, além de solos
menos férteis, têm-se ainda maiores limitações
climáticas para o arábica; tanto de
temperatura como de precipitações, conduzindo
a produtividades médias de apenas 23sc/ha e
acarretando o maior custo observado. A variação
entre o maior e o menor custo unitário variável
alcançou 29%.
No quesito custo operacional, a metodologia da CONAB
promove a contabilização das despesas
com depreciações e outros custos fixos
(manutenção de máquinas e seguro),
além do custo variável já tabulado.
Nesse nível de agregação, as
regiões de Luis Eduardo e São Sebastião
do Paraíso, novamente, exibem o menor e o maior
custo operacional com R$185,91/sc e R$248,60/sc, respectivamente.
No segundo semestre de 2007 a média do preço
recebido pelos cafeicultores no estado de São
Paulo foi de R$244,73/sc(3) que, cotejado com os custos
totais apurados pela CONAB para os distintos cinturões
produtores (soma dos anteriores acrescida de remuneração
para o capital fixo aplicado, sobre o cafezal e a
renda da terra), resulta em resíduo satisfatório
(acima dos 20% - que permite remunerar o esforço
do empreendedor e acumular recursos para novas inversões)
apenas para as lavouras conduzidas sob irrigação
em Luis Eduardo. Em todas as demais modalidades de
exploração, o resíduo foi insatisfatório
para assegurar condições dignas de vida
e permitir novos investimentos, sendo, inclusive,
negativa para os casos de Manhuaçu e São
Sebastião do Paraíso.
Considerando o ligeiro incremento da média
dos preços recebidos em 2008 (de janeiro a
maio), que saltou para R$256,31/sc, o encontro das
contas (receita menos custo) resulta em resíduo
satisfatório para todas as tradicionais regiões
produtoras, sendo que na mais vantajosa delas, Londrina,
o diferencial foi de 16%, enquanto que na menos vantajosa,
São Sebastião do Paraíso, alcançou
3% positivos.
A produção de café é composta
por diversos tipos de qualidades que perfazem desde
o café fino até a varrição.
Assim o preço médio recebido pelo cafeicultor
é algo inferior ao utilizado nesse esforço
de verificação de resultados econômicos
alcançados pelos cafeicultores. Assim, é
licito pensar que para as situações
de resíduo inferior a 10%, existe grande probabilidade
do cafeicultor não ter capturado qualquer excedente,
o que parece bastante razoável diante da realidade
verificável nos principais cinturões
em que se pratica a cultura.
Diante das dificuldades econômico-financeiras
enfrentadas pelos cafeicultores, surge a pergunta:
o que lhes mantém ativos nessa exploração?
Do ponto de vista da economia agrícola, entende-se
que tal permanência ocorre enquanto os preços
recebidos cobrem ao menos os custos operacionais,
fato esse ocorrido sob a vigência dos preços
médios nominais de 2007 e princípio
de 2008. Assim, embora a cafeicultura de arábica
atravesse um momento de baixa rentabilidade, não
são esperados grandes movimentos de substituição
das lavouras por outros cultivos e criações,
pois houve margem para a cobertura dos custos operacionais.
Finalizando, o que devemos esperar para a safra 2008/09?
O sensível aumento dos custos passa a inflacionar
as despesas dos produtores, o que demanda um acompanhamento
mais estrito dos custos buscando selecionar as práticas
agronômicas que resultam em melhor produtividade
e menor custo. Por exemplo, quantos cafeicultores
lembram-se de realizar uma desbrota antes de esparramar
o adubo? Um procedimento simples que pode resultar
em melhor aproveitamento econômico do fertilizante
traduzido em ramos mais vigorosos e produtivos. Assim,
sob o retorno da inflação (que deverá
alcançar os dois dígitos para os custos
da próxima safra), monitorar custos e aplicar
o conhecimento agronômico será fator
decisivo na viabilização econômica
da exploração cafeeira nessa próxima
safra.
Celso
Luis Rodrigues Vegro, Eng. Agr., M.S, Pesquisador
Científico Instituto de Economia Agrícola
- celvegro@iea.sp.gov.br
(1)
Excetuando-se o caso do sistema de cultivo superadensado
implementado no estado do Paraná por iniciativa
do Instituto Agronômico do Paraná (IAPAR),
devidamente apoiado pelo sistema de extensão
rural desse mesmo estado.
(2)
Disponível em www.conab.gov.br/conabweb/download/safra/custosdeproducao_culturaspermanetes
(3)
Em realidade, a comparação deveria ser
com as médias de preços recebidos nas
regiões apresentadas, entretanto tal comparação
não foi efetuada para não tornar demasiado
complexo o artigo e pela facilidade na obtenção
dos números para São Paulo. O preço
recebido representa a média de cinco regiões
produtoras para o tipo 6 de bebida dura.
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