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Junho 2008 - Ano 87 - Nº 826

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Em Jaguaré, município capixaba que ostenta o título de maior produtor de café conillon do Brasil, ocorre um fato curioso: os pequenos produtores vêm obtendo maior produtividade que os grandes. Embora a produtividade média oficial da cidade esteja em torno de 30 a 40 sacas por hectare, um grande número de propriedades vem alcançando, repetidamente, valores acima de 80 sacas por hectare. “Quem produz menos de 60 sacas por hectare é considerado mau produtor”, diz Valchirio José Martins Da Silva, biólogo e extensionista do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural, o prestigiado Incaper.

Os elevados índices de produtividade registrados na região vêm chamando a atenção de todo país, porque possibilitam uma relação custo x benefício muito favorável, e superior, em muitos casos, à existente no segmento de café arábica. Mas por que os pequenos obtém mais produtividade que médios e grandes? A resposta a esta pergunta é chave para se compreender a cafeicultura do norte capixaba. A Revista do Café passou alguns dias entrevistando produtores e agrônomos da região, mais especificamente do município de Jaguaré, e desvendou o segredo.

Em outras regiões, ocorre o contrário. Grandes produtores, por terem acesso à tecnologia avançada e disporem de mais recursos financeiros, obtém altos índices de produtividade, enquanto pequenos patinam em rendimentos muito baixos, às vezes abaixo de 10 sacas por hectare. Em Jaguaré, contudo, não é assim. Uma das razões está na poda. “A poda e a desbrota respondem por 70% da produtividade do conillon”, explica Carlos Giovanni Sossai, cafeicultor local.

Trata-se de um trabalho hércúleo, inteiramente manual, que consiste no corte dos galhos que produziram café, em cada árvore, logo após a colheita. Passado algumas semanas, o produtor deve fazer a desbrota: elimina parte dos brotos nascidos no cotoco dos galhos retirados, deixando apenas os mais vigorosos.

Outra explicação é o processo de colheita, que ainda não pode ser mecanizado. Os grãos do conillon são mais agarrados aos galhos que os do arábica: as máquinas existentes não conseguem desprendê-los da árvore. Essa necessidade de cuidar de cada árvore, individualmente, complica-se no caso de áreas muito grandes. Ressalve-se: complica mas não inviabiliza: os grandes também vem obtendo excelente nível de produtividade.

Enfim, o pequeno, justamente por possuir pouca área, procura explorá-la ao máximo, utilizando toda tecnologia disponível. Giovannia Sossai, por exemplo, que possui 60 mil pés plantados em 37 hectares (dos quais 25 são produtivos, o restante está em formação), conseguiu produzir 71 sacas por hectare em 2007 (um ano ruim, segundo ele, por conta da seca no início do segundo semestre), obtendo um custo de R$ 100 a saca, ao qual, explica o produtor, deve-se acrescentar 20% de custo administrativo.

Em 2006, Sossai havia obtido uma produtividade de 135 sacas por hectare – o que permitiu um custo bruto de R$ 69,27 a saca. Sossai tem 7 empregados fixos e, no tempo da colheita, emprega um homem para cada 500 pés, ou cerca de 120 pessoas. Para reduzir os danos provocados pela inevitável redução no uso de fertilizantes, Sossai prevê que os cafeicultores irão explorar ao máximo as reservas de nutriente do solo. “Fazendo análise do solo, poderemos detectar se há uma boa reserva de fósforo, por exemplo. Então, economizaremos no fósforo”, explica.

Jarbas Altoé, também cafeicultor de Jaguaré, é outro exemplo de como a tecnologia vem permitindo o aumento da produção de café no norte do ES. Altoé conta que seu pai produzia cerca de 500 sacas de café. Na mesma área, sendo que metade ainda está em formação, ele produz hoje mais de 2.000 sacas por ano. Quando as lavouras novas amadurecerem, em dois anos, colherá cerca de 5.000 sacas. A produtividade de suas lavouras está em média de 80 sacas por hectare, um patamar que ainda não o satisfaz. “É pouco”, diz ele, decepcionado e preocupado com o aumento do preço dos fertilizantes. Os produtores da região estimam que as compras de adubo devam cair mais de 30% este ano.

Em função da colheita ser inteiramente manual, há uma enorme geração de empregos. Gente do comércio relata que a cidade transforma-se totalmente no período, com a chegada de milhares de pessoas da Bahia e outras regiões do estado. O pagamento é feito diariamente, por produção. Paga-se de R$ 5 a R$ 6 por saco de 80 litros. Um trabalhador consegue colher, em média, 10 sacos por dia, ganhando em torno de R$ 50. Alguns mais rápidos, conseguem colher até 20 sacos diariamente, faturando mais de R$ 100.

Os trabalhadores que fazem a poda e desbrota, a primeira realizada imediatamente após o término da colheita (um ou outro a fazem durante a colheita) ganham aproximadamente R$ 50 por dia.

Maria Caldeira Oliveira, 51, e Maria da Paixão, 46, trabalham na colheita de café em Jaguaré. Afirmam que o trabalho é bastante tranqüilo, porque podem organizar livremente seu próprio horário, o que lhes permite conciliar a colheita com as atividades domésticas.

A estratificação fundiária de Jaguaré, pesquisada recentemente pela Incaper, mostra o predomínio do pequeno produtor. O município possui 1.883 propriedades rurais registradas, das quais 59% não tem mais que 20 hectares; 32% tem entre 20 e 80 hectares; 7% tem entre 80 e 500 hectares; 1% possui entre 500 e 1.000 hectares; e há somente 10 propriedades (0,5% do total) com área superior a 1.000 hectares.

A marca mais importante, porém, dos cafeicultores de Jaguaré é algo mais subjetivo: coragem de inovar. Rodando pelas lavouras da região, observa-se que todos os produtores estão constantemente renovando seus cafezais, substituindo árvores antigas por variedades genéticas modernas, como o Robustão ou o Vitória. E quando, por algum motivo, algo dá errado, eles arrancam tudo e plantam de novo.

Outro tradicional produtor de Jaguaré é Angelim Sescom, 61, que em 2007 foi o vencedor do prêmio de qualidade e produtividade organizado pela prefeitura. Para este ano, Angelim também está entre os favoritos. Sescom trabalha com seus dois filhos, Wellington e Wagner, numa propriedade com 18 alqueires (43,5 hectares). Os Sescom possuem 70 mil pés de café, dos quais 50 mil são produtivos e o resto ainda está em formação. Eles vêm obtendo produtividade média de 90 sacas por hectare, e um custo de produção de R$ 130 por saca.

João Malanquini, 52, observa que o produtor de café do norte capixaba não irá abandonar a atividade em função do aumento dos custos, mas deve reduzir os investimentos. “Um saco de 50 kg de adubo custava R$ 25 em 2006, foi para R$ 45 em 2007 e este ano chegou a R$ 65”, adverte. Segundo ele, o produtor, que aplica cerca de 1 kg de adubo por pé de café, diminuirá a quantidade para até 450 gramas. O seu custo de produção em 2008 foi de R$ 110 a saca de 60 kg.

Visão do exportador

Carlos Henrique Bortolini, trader chefe da Custodio Forzza, principal exportadora brasileira de café conillon, acredita que o Brasil, e o Espírito Santo em particular, tem potencial para elevar sensivelmente a produção da variedade. Ele admite, contudo, que o aumento do preço do fertilizante, e dos custos em geral, podem atrasar a realização deste potencial. A Forzza está fortemente estruturada na região produtora de conillon:

tem um armazém com capacidade para 150 mil sacas em Linhares, outro de 100 mil sacas em Colatina e está terminado de construir um armazém de 70 mil sacas no sul da Bahia, novo pólo do conillon, devido à migração de produtores capixabas para a região.

Bortolini observa que o diferencial entre o conillon brasileiro e seu principal concorrente, o robusta vietnamita, caiu expressivamente nos últimos meses, elevando a competitividade do primeiro e permitindo o aumento do volume exportado. A Forzza exportou 342.594 sacas de conillon em 2007, volume estável em relação ao ano anterior e que correspondeu a 24,5% das exportações brasileiras. Os bons preços verificados no início deste ano, e o recuo do Vietnam, fizeram a empresa aumentar fortemente suas vendas. De janeiro a maio de 2008, a Forzza já exportou 199.661 sacas, alta de 330% sobre o ano anterior, correspondente a 35% da exportação nacional da variedade. Segundo Bortolini, entre exportação e venda ao mercado interno, a empresa movimenta anualmente cerca de 1 milhão de sacas de conillon.

A rentabilidade do conillon, observa Bortolini, tem se mostrado bastante superior a do arábica. No arábica, são necessários 6 a 7 sacos de café pilado em coco para produzir 1 saca de 60 kg de café beneficiado. No robusta, apenas 4 sacos pilados perfazem 1 saca beneficiada de 60 kg. A relação custo de produção e preço de mercado também tem dado vantagem ao conillon, lembra Bortolini. Uma terceira vantagem importante do conillon é que, por ser um produto de sabor neutro, ele não perde qualidade enquanto armazenado. Ao contrário, as indústrias pagam de R$ 10 a R$ 15 de ágio para cafés velhos. Ele lembra que, no caso do arábica, cafés velhos são vendidos com forte deságio, porque perdem aroma e sabor. “O conillon é mais resistente a doenças e quase não tem bianualidade”, acrescenta o trader.

Produtores de outras regiões também querem plantar conillon

Os extraordinários índices de produtividade registrados no norte capixaba vêm chamando a atenção de produtores de outras regiões, notadamente de São Paulo e Minas Gerais, onde há áreas com sérios problemas de renda. O Conselho Nacional do Café (CNC) enviou representantes da cafeicultura de Minas Gerais ao norte do Espírito Santo para analisar a viabilidade de um possível programa de substituição do arábica pelo conillon nas áreas mais quentes e baixas do estado. A CATI, órgão de extensão rural do estado de São Paulo, enviou técnicos ao ES, com o mesmo objetivo.

Esses movimentos, porém, ainda são bastante incipientes e os técnicos acreditam que será preciso alguns anos de pesquisa antes que faça sentido haver incentivo oficial para cultivar conillon em Minas ou SP. Mas já tem gente arriscando por conta própria. Ricardo Tavares, dono da Atlântica Exportação, ex-proprietário da Três Corações, adquirida pelo grupo israelense Elite-Strauss, revela que o projeto de sua empresa é cultivar 615 hectares de conillon no norte de Minas, próximo à cidade de Pirapora, na beira do rio São Francisco. A depender do resultado, a empresa pode ampliar a área para 1.000 hectares, e plantar 3,5 milhões de pés de conillon.
Tavares diz que os técnicos do Incaper foram à região e verificaram que o clima e a topografia são propícios para o conillon. “Nossa meta é ter uma produtividade de 90 a 100 sacas por hectare”, explica o empresário. Ele ressalta, contudo, que o projeto ainda está em fase inicial, com plantio de 40 hectares que servirão para reproduzir mudas, posteriormente plantadas num sistema de irrigação com pivô central.

CATI: Conillon em SP ainda terá que suportar dificuldades

O engenheiro agrônomo, Norberto Luiz de Oliveira Filho, da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral (CATI), órgão subordinado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, explica que a iniciativa de se plantar café conillon no Estado de São Paulo, partiu da Câmara Setorial de Café, com o apoio da ABIC. “O fato justifica-se”, diz Oliveira, “não só pelos altos preços alcançados com o produto nos dias de hoje, mas também pelo fato de o Estado de São Paulo possuir amplas áreas marginais ao cultivo do Arábica; além, é claro, do ICM que vai para o estado onde o café é produzido.”

Oliveira informa que a CATI enviou, ao Espírito Santo, 4 técnicos para conhecer o programa do Incaper sobre as variedades, o manejo da cultura e a colheita desse material. A partir daí, diz o agrônomo, será elaborado um programa de importação de materiais para, juntamente com a pesquisa paulista, conseguir informações que permitam a introdução do conillon no Estado. “Muitas dificuldades deverão ser vencidas, que vão desde a diferença de ecossistemas, até a ameaça de pragas que lá não se manifestam”. Ele observa que o estado possui nematóides muito agressivos e que ainda há dúvida quanto à resistência das variedades de conillon a esse problema.

Oliveira nota que São Paulo tem áreas, no oeste e noroeste do estado, onde o plantio de arábica “vai mal”, apresentando baixa produtividade, mas que, por registrar clima quente e topografia pouco elevada, podem se revelar favoráveis ao cultivo de conillon.

O agrônomo admite, no entanto, que a implantação do conillon em São Paulo deve demorar no mínimo 3 a 4 anos, tempo necessário para condução de experiências com diversas variedades genéticas. “Não vamos colocar o produtor numa furada”, argumenta. Mas se a viabilidade ficar demonstrada, explica o funcionário, o governo de SP e suas indústrias poderão incentivar, com recursos financeiros e assistência técnica, a produção paulista de conillon.

Ximenes: Conillon dá lucro, arábica não

Sobre a intenção de trazer o plantio de conillon para o estado de Minas Gerais, o presidente do Conselho Nacional do Café (CNC), Gilson Ximenes, admite que, de fato, alguns cafeicultores mineiros cogitam substituir suas lavouras de arábica por conillon. Isso ocorre, explica Ximenes, em função da boa rentabilidade que o café robusta vem proporcionando. “Ao passo que o arábica, na média dos últimos anos, vem sendo comercializado abaixo dos custos de produção”.

É natural, diz o presidente do CNC, que os produtores avaliem a possibilidade de migrar para o cultivo de uma outra variedade que tenha melhores perspectivas financeiras. “E como o Espírito Santo é o principal produtor nacional de conillon, alguns produtores mineiros foram até lá para conhecer o sistema de plantio e saber quais os custos de produção e a rentabilidade com a comercialização”.

Ele faz uma ressalva: “é importante alertar aos produtores mineiros que o paralelo da rentabilidade do conillon com a do arábica deve levar em consideração as condições climáticas e geográficas – sempre lembrando que o robusta se adapta melhor a regiões mais quentes e com menor altitude".

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