Além
de maior produtor e exportador de café, o Brasil
também está na vanguarda de programas
que atestem a qualidade e segurança do produto.
Por meio do Consórcio Brasileiro de Pesquisa
e Desenvolvimento de Café (CBP&D/Café),
coordenado pela Embrapa Café, o país
tem desenvolvido ações que visam a implantação
de programas de controle e prevenção
de fungos toxígenos e formação
de Ocratoxina A (OTA) na cadeia produtiva do café.
A
prevenção e redução
de contaminação de OTA, a quem é
atribuída malefícios à saúde,
entre eles, efeito carcinogênico, tem sido
tema debatido no âmbito do Codex Alimentarius,
programa conjunto da Organização
das Nações Unidas para a Agricultura
e a Alimentação – (FAO) e
da Organização Mundial da Saúde
– (OMS), que o Brasil participa dentre 177
países membros. Neste sentido, a pesquisa
brasileira tem contribuído para a elaboração
e divulgação de índices sugeridos
neste fórum, sendo referência mundial
para consumidores, produtores, organismos internacionais
de controle e comércio de alimentos. Desde
1980, os interesses nacionais na regulamentação
dos alimentos, entre eles o café, são
representados no Comitê do Codex Alimentarius
do Brasil (CCAB), composto por 14 representantes
do governo e setor privado. |
Paulo
Cesar Afonso Júnior |
O café é um produto agrícola
baseado em parâmetros qualitativos, sendo que
a ocorrência de microorganismos nas fases de
pré e pós-colheita é um dos fatores
determinantes para sua desvalorização.
Neste contexto, a compreensão de normas internacionais
sobre segurança alimentar se faz necessária
para harmonização e a manutenção
do desempenho dessa atividade econômica em um
ambiente globalizado de comercialização.
A Comunidade Européia, com o objetivo de controlar
a presença de OTA em grãos de café
e derivados tem recomendado níveis máximos
de tolerância de 5 µg/kg para ocratoxina
A no café torrado e moído e 10 µg/kg
no café solúvel destinados a comercialização
(em vigor desde abril de 2005). Apesar de ainda não
existirem níveis determinados para o café
verde, alguns países já priorizam o
seu controle, como é o caso do Brasil, que
desenvolve metodologia analítica para determinação
da OTA com validação na AOAC (Association
of Official Analytical Chemists) internacional.
Embora o Brasil esteja agindo proativamente neste
assunto, até o momento não existem condições
técnicas definitivas para o estabelecimento
de limites de OTA em café cru. Em sua avaliação,
deve-se investir em estudos, pesquisas e ações
que contribuam para o fortalecimento do domínio
das questões técnicas envolvidas, bem
como da capacitação de laboratórios
de análise para monitoramento do produto.
A contaminação com fungos produtores
de OTA pode ser minimizada seguindo boas práticas
agrícolas, com técnicas adequadas de
preparo, secagem, transporte e estocagem dos grãos
de café. Para isso, torna-se fundamental o
incentivo às soluções tecnológicas
e às ações que privilegiem a
adoção de boas práticas agrícolas,
como forma de prevenção e de exercício
de uma cafeicultura sustentável, atenta à
qualidade do produto e à segurança da
saúde humana.
Conquistas
brasileiras
Iniciativas brasileiras têm disponibilizado
ferramentas de controle de micotoxinas em café
e as pesquisas apontam que apenas cafés muito
mal manejados apresentam níveis de OTA superiores
ao tolerado. Institutos de pesquisa e ensino ligados
ao CBP&D/Café desenvolvem metodologia analítica
para determinação de OTA tanto em café
cru, como aprimoram os métodos para detecção
em café torrado, moído e solúvel,
de acordo com os limites de tolerância propostos
pela União Européia. Também existem
programas de proficiência para análises
de OTA, com a capacitação e equivalência
dos laboratórios credenciados.
Outros estudos visam ao desenvolvimento de pesquisas
para validação de plano de amostragem
para café cru, torrado, moído e solúvel,
que traduza a verdadeira condição do
lote de café e que seja aceito pela AOAC internacional.
Pesquisadores brasileiros utilizam o sistema HACCP/APPCC
(Hazard Analysis and Critical Control Point/Análise
de Perigos e Pontos Críticos de Controle),
como ferramenta para análise de amostras e
no controle dos fatores que promovam a produção
da OTA.
Paralelo ao desenvolvimento de metodologias, vem sendo
realizado o monitoramento das principais regiões
produtoras em relação à produção
de fungos toxígenos. O controle da OTA também
faz parte das prioridades do programa nacional de
Produção Integrada para o Café
(PIC), que fornecerá subsídios para
a manutenção de boas práticas
agrícolas na cafeicultura brasileira e entrará
em vigor em meados de 2009.
Evolução
e controle
Há muitos anos a União Européia
estabelece níveis máximos permitidos
de OTA para diversos produtos, com o objetivo de reduzir
ao mínimo a possibilidade de exposição
da população a esta substância.
No início da década de 1990, teve início
um programa de harmonização de regulamentos
sobre micotoxinas em alimentos, que incluem níveis
máximos de OTA.
Recentemente, especialistas em aditivos alimentares
no âmbito do Codex Alimentarius, em estudo para
avaliação de risco com a ingestão
alimentar de OTA, concluíram que o café
tem participação menor na ingestão
global comparado aos outros produtos como cereais
e vinho.
Uma norma do comitê especial do Codex (CE) Nº
1881/2006 dispõe sobre a proibição
da mistura de produtos alimentícios que excedam
aos limites máximos estabelecidos. Como não
há limites previstos para o café cru,
a legislação não afeta a mistura
de lotes com diferentes níveis de contaminação.
No entanto, para os cafés torrado, moído
e solúvel, não é permitida a
mistura de lotes com níveis de contaminação
superiores aos estabelecidos. O que significa que
é vedado, por exemplo, a mistura de um lote
de café torrado com contaminação
de 9 µg/kg a um outro lote com teor de 1 µg/kg,
com o objetivo de gerar um terceiro lote com teor
de contaminação médio de 4 µg/kg.
A regulamentação prevê também
a proibição de desintoxicação
do café com produtos químicos.
Paralelo à normatização, alguns
governos estabeleceram níveis máximos
para a OTA em café torrado, solúvel
e, em alguns casos, café verde. Alguns destes
limites estão previstos em leis e outros servem
como diretrizes para inspeção de inocuidade
de alimentos. Na Finlândia e Suíça,
por exemplo, o limite de OTA para o café verde
é o mesmo para o torrado e moído (5µg/kg).
Na Alemanha e Países Baixos não existem
limites previstos para o café verde.
Redução
de riscos
Torna-se
importante ressaltar que no processamento industrial
do café verde (torrefação, produção
de café solúvel ou descafeinado) elimina-se
uma considerável quantidade de OTA. Estudos
científicos demonstram que em práticas
normais de torrefação são registradas
substanciais reduções de OTA durante
os testes. Outros estudos têm revelado que os
processos normais de retirada da cafeína eliminam
em torno de 75% da OTA presente na matéria-prima.
Isto é possível porque a OTA é
muito solúvel no meio de extração
utilizado normalmente para eliminação
da cafeína.
Com base na redução de OTA durante o
processamento industrial do café, a Federação
Européia do Café (European Coffee Federation)
tolera em suas diretrizes a compra de café
cru com uma contaminação por OTA de
15 µg/kg, considerando que resultará
em um produto final (torrado, solúvel e descafeinado)
que não supera os limites máximos estabelecidos
pela UE .
Em 2008, foram realizadas duas reuniões do
comitê especial do Codex para tratar o assunto.
Na reunião de Haia - Países Baixos -
ficou definida a necessidade de se fixar um nível
de máximo para OTA em café cru, que
será avaliada depois da aprovação
do código de práticas de prevenção
e redução de OTA em café. Em
Genebra – Suíça - foi apresentado
e debatido o “Código de Práticas
Para a Prevenção e Redução
de Ocratoxina A em Café”, realizado pela
FAO com efetiva participação do Consórcio
Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento do Café
- CBP&D/Café. O documento final será
apresentado e discutido na próxima reunião
do Codex, que se realizará no período
de 23 a 27 de março de 2009, em Roterdã,
Países Baixos.
Atento a este contexto, a Organização
Internacional do Café (OIC), desde 2002, incentiva
elaborações de estudos e diretrizes
para reduzir a preocupação do mercado
e os efeitos da presença de OTA na cadeia produtiva
do café. Como líder mundial na produção
de café, o Brasil tem assumido o domínio
e o conhecimento sobre as condições
que podem levar a ocorrência de OTA no campo
e pós-colheita, com o efetivo incentivo do
CBP&D/Café para o desenvolvimento de métodos
de detecção da toxina em todas as formas
de comercialização e consumo de café.

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