Já
se discutiu demais em período superior a 30
anos a conveniência de importar café
verde sob o regime aduaneiro de draw-back, isto é,
adquirir no exterior livre de tributos matéria
prima para industrialização de café
solúvel ou torrado e moído com a obrigatoriedade
de exportar o produto final com o valor agregado de
custos de mão de obra, embalagens, rótulos,
energia elétrica e outros insumos empregados
no processo manufatureiro.
Vale acrescentar que o café verde importado
formaria “blends”, ou seja, seria misturado
com cafés brasileiros majoritários na
composição, significando que à
pequena quantidade de produto trazido de fora seria
adicionado grande volume de café produzido
aqui.
Essa matéria foi exaustivamente estudada no
CIC (Centro de Inteligência do Café)
e na Comissão Técnica pertinente do
Conselho Deliberativo da Política do Café
(CDPC), recebendo parecer favorável. Elaborou-se
Portaria do Ministério da Agricultura, Pecuária
e Abastecimento regulando a questão, sendo
adotadas todas as salvaguardas necessárias
sobre a inexistência de riscos fitossanitários
nos países produtores de café verde
robusta e arábica, que seriam previamente inspecionados
por engenheiros agrônomos do MAPA, que emitiriam
laudo considerando-os aptos para serem usados pelas
manufaturas brasileiras.
Estão previstas exigências de pagamento
à vista, classificação COB 8
quando os cafés são destinados ao solúvel
e tipo 6, bebida dura para melhor, se adquiridos por
torrefações. Impuseram percentual de
importação por companhia, proporcional
ao volume exportado de produto acabado nos doze meses
anteriores, e há normas específicas
para empreendimentos novos. Aliás, um dos objetivos
principais dessa iniciativa do draw-back é
estimular a vinda de sociedades de café solúvel
e de torrefação e moagem para cá.
Vejam que afora a Nestlé de café solúvel,
implantada em nosso país há mais de
meio século, e que se dedicava somente ao suprimento
do mercado interno, outras 11 empresas se instalaram
com vistas à exportação, graças
aos incentivos tributários e creditícios
assegurados pelos governos Juscelino Kubitschek, Jânio
Quadros e João Goulart no final dos anos 50
e início dos 60, continuados pelos presidentes
militares.
Em 1967, travou-se a chamada “guerra do café
solúvel”, confrontando Brasil e Estados
Unidos, que ameaçaram taxar o produto brasileiro
para proteger suas fábricas, evidenciando-se
o paradoxo do maior produtor de café verde
ser proibido de produzir e exportar café solúvel.
Afinal, chegou-se em 1968 a um acordo diplomático
pelo qual o próprio governo brasileiro taxou
o produto industrializado em nível aceito pela
América do Norte.
Com o impedimento de não poder ser feita a
importação de café verde pelo
regime de draw-back, como ocorre em todos os países
onde há estabelecimentos de café solúvel,
5(cinco) firmas soçobraram, embora falhas de
gestão tenham concorrido para seu desaparecimento.
Remanesceram a Nestlé, Cacique, Iguaçu,
Realcafé, Cocam, Mogi e Brasília, com
presença expressiva da Três Marias e
Branco Peres, que não têm instalações
próprias e utilizam as de terceiros.
Aspecto relevante a ressaltar que torrefações
multinacionais importantes atuando no mercado brasileiro
como a Sara Lee, dona de 22% do mercado interno, certamente
passariam a exportar café torrado e moído
se pudessem dispor de blends com café verde
importado.
A mineira Bom Dia foi compelida a terceirizar produção
nos Estados Unidos para atender clientes de lá
que pretendiam comprar café torrado com blends
de matéria-prima não totalmente brasileiros.
O draw-back é prática universal e no
Brasil o fazemos com a soja e diversos produtos agrícolas,
exceto o café verde. Essa anomalia não
pode continuar porque perdemos indústrias de
solúvel e de torrefação para
outros destinos.
O Ministro Reinhold Stephanes, que tem demonstrado
competência e coragem no enfrentamento de interesses
poderosos, como o de fertilizantes importados, incentivando
programas para o Brasil produzir aqui os insumos nitrogênio,
fosfato e potássio (NPK) objetivando nos tornarmos
auto-suficientes nessa área, precisa arrostar
esse preconceito absurdo contra o draw-back do café,
que não tem fundamentação alguma
e está impedindo a atração de
investimentos, notadamente no setor do café
solúvel.
Léo
de Almeida Neves
Membro da Academia Paranaense de Letras, deputado
federal e ex-diretor do Banco do Brasil
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