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Setembro 2010 - Ano 89 - Nº 835

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O mercado de café sempre foi sofisticado e complexo. Neste momento é ainda mais difícil. É com muita apreensão que registro minhas reflexões sobre a safra colhida em 2010 e suas consequências para o período de 2011 a 2014.

 Acompanhando o mercado desde 2004, com uma avaliação econométrica, fica evidente que ele está em risco de rupturas de fornecimento, principalmente em cafés da variedade arábica, com bebida lavada ou despolpada muito fina, conhecidos como Colombian milds ou milds.
Até maio deste ano, poucas pessoas se mostravam preocupadas com a questão. Mas, com os preços atuais, que deverão flutuar em patamares elevados, temos que refletir muito para construir um modelo novo de mercado e não quebrar essa importantíssima cadeia de produção, ora na produção, ora na comercialização.

Desde os anos 90, a verdadeira oferta de café no mundo vem crescendo um pouco mais do que 1 milhão de sacas por ano e a demanda vem crescendo um pouco menos de 2 milhões de sacas por ano. Parece uma diferença pequena, mas acumulada faz muita diferença. E os preços, que deveriam refletir essa tendência, ficam somente flutuando em função da percepção do mercado e não da realidade dos estoques reguladores. É impressionante o resultado, se utilizarmos os números informados pela USDA ou OIC. Se a USDA estivesse certa, o estoque mundial seria hoje maior que 50 milhões de sacas. Pela OIC quase 10 milhões de sacas. Como é possível tanta discrepância, e pior, os preços recentes e atuais mostram que o mercado tem que ter no estoque de passagem entre safras, medido em 30 de junho, de 28 a 30 milhões de sacas, somando-se o estoque nos países produtores e consumidores, governamental e privado.

Os preços baixos, por um longo período desanimaram os produtores e muitos tiveram que abandonar lavouras ou trocar as culturas. Somando-se a falta de mão de obra e os custos elevados, a equação ficou insustentável. Mudanças climáticas também aumentaram as dificuldades para o plantio de arábica em algumas regiões do mundo; sem contar que muitas áreas de café passaram a receber competição da produção para os biocombustíveis.

Mas o que é possível fazer? Primeiramente é necessário identificar os problemas potenciais e suas causas raiz. Somente conscientizar-nos de que há risco de desabastecimento repentino é insuficiente. Devemos aprimorar as estatísticas, com muita transparência, a fim de reduzir os absurdos movimentos dos altistas e baixistas, que tumultuam os mercados e não permitem planos de longo prazo para o sistema cafeeiro, principalmente aos produtores que têm sofrido muito.

Devemos olhar a questão do café numa escala bem maior, tanto temporal como estrutural e colocar a questão da sustentabilidade econômica e ecológica como estratégia para toda a cadeia. Um pacto de cavalheiros, pelo menos no jogo dos números das previsões, chegando-se a cifras mais realistas que se sustentem no longo prazo, é vital neste momento.

Institutos como o CECAFÉ, no Brasil e o OIC, entre outros, poderiam trabalhar nas causas raiz e propor uma construção de hipóteses e cenários de curto, médio e longo prazo para a cadeia como um todo, analisando medidas alternativas de estímulo e compensação para os produtores, que são o início da cadeia e a base de tudo. O jogo dos ganhos e perdas no modelo Wall Street já colocou bancos e sistema financeiro em apuros, mas lá o problema é corrigido com a emissão de moeda e a ajuda dos bancos centrais. No café, ainda não aprendemos a imprimir grãos verdes nem temos um banco central de grãos para garantir o fluxo de moeda aos países em risco. O mercado de café vive sofrendo de bolhas de oferta e bolhas de demanda, matando os menos avisados e mais fracos, destruindo sistemas sociais e humanos.

Somente a produção equilibrada, pelos próximos dez anos poderá ajustar essas arriscadas distorções. Se no passado, o “Não” saber exato era uma parte importante do jogo, agora o importante é o “Saber”, para resguardar o elo mais fraco da cadeia.

Precisamos também compreender muito bem quais são os custos corretos para cada saca de café, em cada país, e construir um modelo de equivalências reguladoras. Também devemos contratar estudos sobre os impactos, em cada espaço produtor, das consequências e das dificuldades da produção na montanha, da mão de obra que está mais escassa e dos outros setores que estão competindo diretamente, das dificuldades de financiamento para os pequenos e da produção que vem caindo em muitos países.

Também há a necessidade de se começar a precificar os cafés pela qualidade, em cinco grupos (robusta, robusta fino, arábica natural, arábica fino, arábica extrafino) por conta da importância de cada um na sua aplicação, como o mercado automaticamente vem fazendo. Seria somente ler o que o mercado vem precificando.

Cada vez mais o mercado vem valorizando os pouquíssimos cafés lavados e despolpados extrafinos, uma tendência clara, ao mesmo tempo em que o robusta vem se desvalorizando. Muitos poderiam culpar os preços elevados somente pela acentuada queda de cafés finos, em função da crise de produção na Colômbia. Mas não é só isso. O problema é estrutural.
Muitos compradores internacionais, assim como a indústria, poderiam colocar parâmetros mínimos para compras dos produtores, com seus contratos resguardados por uma câmara de compensação.

O quadro para 2010/14 é caótico. O equilíbrio entre a oferta e a demanda vai gerar riscos de desabastecimento turbulento ou preços exagerados, que provocarão crises cíclicas a cada quatro anos. Os estoques reguladores muito baixos são possíveis hoje por conta da melhoria da logística e da comunicação, mas chegaram ao piso mínimo para sustentar uma cadeia de produção do consumo muito defasada e com tempo mínimo entre produtores e consumidores.

Trabalhar com estoques totais abaixo de três meses é o que basta para os preços ficarem loucos mediante qualquer notícia de frio, chuva ou seca. A questão do arábica fino é ainda mais crítica e não há previsão de melhora no curto prazo.

A conclusão é simples: os produtores e os consumidores precisam desenhar uma estratégia sustentável e viável, para não permitir o colapso da cadeia. Se os preços subirem demasiadamente, é ruim, pois haverá uma forte tendência dos produtores ampliarem plantios irracionais, endividando-se, o que fatalmente levará a uma super-safra e nova onda de preços baixos que podem quebrá-los.

A gangorra de preços e produção pode levar a cadeia do café para uma maior concentração de indústrias e traders, quebras na produção, criando uma nova crise em mais quatro anos e problemas sociais enormes; sem contar que poderá jogar pequenos produtores para alternativas não recomendáveis.

Luís Norberto Pascoal
Diretor Presidente da Daterra Atividades Rurais

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